Antes de qualquer intervenção urbanística e visível, o renascimento dos centros históricos com as lojas do comércio de rua passa por uma reforma mais profunda e subjetiva: a mudança de mentalidade na gestão dos espaços comuns e o fortalecimento da ideia de uma administração autônoma concentrada mais nas mãos de um grupo organizado do que na dependência do poder público.



A modernização de um grande centro começa com o planejamento de uma ocupação com eventos culturais e investimentos necessários, principalmente na manutenção das áreas utilizadas por todos e na segurança de frequentadores e trabalhadores, que movimentam o centro e trazem uma nova dinâmica para a região.



Esse modelo de gestão, com exemplos de sucesso em cidades europeias, foi apresentado pela professora e pesquisadora Eloísa Ramos Ribeiro Rodrigues, do CTU (Centro de Tecnologia e Urbanismo) da UEL (Universidade Estadual de Londrina) durante o terceiro encontro do projeto de revitalização do Centro Histórico, organizado pela Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina).



Segundo a pesquisadora, o comércio é um motor muito importante para os centros da cidade, no entanto, as áreas passam por declínio com o esvaziamento das regiões centrais com a migração das atividades para outros espaços, que tomam o protagonismo econômico nas cidades, como shoppings e outros centros comerciais urbanos em bairros mais distantes.



“O conceito de centro é relativo e o processo de declínio é cíclico. Houve um tempo em que as próprias atividades administrativas dos municípios estavam no centro e também houve um esvaziamento dessas atividades. Em Londrina, da década de 90 para frente, se intensificaram os centros comerciais nas áreas periféricas e houve uma migração desse conjunto de comércio e serviços. Mais recentemente, temos novos prédios comerciais em avenidas como Madre Leônia e Ayrton Senna, na zona sul, e as clínicas médicas concentradas na Bandeirantes e na Souza Naves”, exemplificou.


Para ocupação do Centro de Londrina, principalmente, o Calçadão, Rodrigues defende que uma agenda própria na área cultural e de eventos para criação de um fluxo importante de pessoas na região, onde estão concentrados ativos culturais como museus, o Ouro Verde, o Villa Rica o teatro do Colégio Mãe de Deus, que podem ser “conectados em sinergia para fortalecimento” do centro histórico e comercial com atividades na área de serviços como gastronomia e entretenimento.



“A experiência internacional mostra um caminho de gestão do centro das cidades na mesma lógica de shoppings centers. São formas de organização que permitem a arrecadação de recursos próprios para que o grupo possa fazer investimentos locais, como manutenção, zeladoria e limpeza e segurança com objetivo de movimentar a região com atividades, compras e atendimento de qualidade”, analisa.



Mas, a pesquisadora avalia que essa mentalidade ainda precisa ser implementada no Brasil, onde existe um apoio limitado das entidades ao comércio de rua, enquanto em outros países, os comerciantes conseguiram criar uma figura como se fosse um órgão responsável pela administração do espaço e aplicam os recursos com autonomia.



“O grupo organizado pode executar planos urbanísticos, planos de negócios, marketing, sem depender do poder público, pois tem recursos próprios para fazer essas ações e isso gera movimentação. Todo esse esquema é utilizado para gerar fluxo. O que move, o que engaja a atividade comercial e faz com que você tenha uma frequência é, justamente, gerar fluxo na área central. Atualmente, acontece o contrário no centro de Londrina”, pondera.


Na avaliação dela, o comércio no centro da cidade é segmentado, com lojas populares e não consegue atrair públicos de todas as faixas de consumo. Além disso, as ações culturais “espaçadas” não colaboram com a reativação das atividades no Calçadão.



“Cada segmento cultural tem sua agenda própria, mas não algo coordenado por entidades comerciais para uma programação anual de eventos no centro. Isso gera fluxo e, consequentemente, a reativação dos comércios, atraindo novas lojas e serviços”, sugere Rodrigues que define a área central como o espaço entre as avenidas Juscelino Kubitschek e Leste-Oeste, até a Duque de Caxias, que fecha o quadrilátero.



No Brasil, Rodrigues lembra que existem algumas iniciativas nos centros do Rio de Janeiro e São Paulo. Em Londrina, os grupos de comerciantes já se organizaram na rua Sergipe, na Duque, no Calçadão e na rua Guaporé.


“As governanças locais entendem quais são os problemas de cada área e podem desempenhar os papéis de catalisadores deste processo de mudança. A diferença é que fora do País já existe a reversão de taxas e impostos para investimentos locais pelo próprio grupo gestor do comércio de rua”, informou.

PROJETO

Gerson Guariente, diretor Institucional da Acil, responsável pela coordenação do projeto de revitalização do Centro Histórico de Londrina, avaliou que as ações que deram certo em outros países, mostram a participação de diferentes setores da sociedade e o engajamento de moradores e empresários locais, além do apoio do poder público.

Para a próxima reunião, que será realizada neste mês, Guariente informou que formulários foram enviados para comerciantes, empresários e pessoas envolvidas com o dia a dia do centro da cidade para a criação de uma base de informações que pode embasar as discussões, apontar alternativas e revelar ameaças e oportunidades. “Vamos organizar as ações de curto, médio e longo prazo e elaborar um projeto com esse diagnóstico e buscar a fundamentação técnica”, adiantou.