Compreender como os facilitadores de grupos de reflexão conseguem desconstruir o comportamento de homens com histórico de agressão foi o principal interesse da mestra em Ciência Jurídica pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Jurídica da Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP, Tayana Roberta Muniz Caldonazzo, autora de "Violência Doméstica Contra a Mulher - A Desconstrução da Masculinidade Hegemônica", publicado pela Juruá Editora. "Eu precisava ter noção de como as equipes interdisciplinares trabalhavam e sugerir posturas para alcançar mudanças", explica.


Adaptação de dissertação de mestrado na área de Direito, na UENP de Jacarezinho, a obra tem 200 páginas e Caldonazzo adianta que conseguiu chegar a conclusões relevantes: "Posturas autoritárias de facilitadores - que são psicólogos ou advogados voluntários - não funcionam. O diálogo não pode ser inibidor, ao mesmo tempo em que o facilitador não pode ser permissivo", destaca. A conclusão se faz pelo seguinte entendimento: "Uma disputa de poder entre facilitador e agressor não é frutífera. É necessário que o profissional tenha uma bagagem sobre masculinidade e estudos de gênero e a abordagem deve ainda considerar as interseccionalidades, ou seja considerars as diferentes histórias de vida de cada homem que agride: sua raça, classe, sexualidade e atravessamentos que aconteceram em sua vida para compreender melhor a pessoa. Mas não vitimizá-la, mas conhecê-la", ratifica.

Tayana Roberta Muniz Caldonazzo:  "É necessário que os profissionais das equipes multidisciplinares tenham uma bagagem sobre masculinidade e estudos de gênero"
Tayana Roberta Muniz Caldonazzo: "É necessário que os profissionais das equipes multidisciplinares tenham uma bagagem sobre masculinidade e estudos de gênero" | Foto: Divulgação

COMO FUNCIONAM OS GRUPOS REFLEXIVOS

Da tese de mestrado para a publicação do livro, Caldonazzo também trouxe novos temas, assuntos atuais ligados à violência contra a mulher e referências de outros trabalhos. A autora destaca que infelizmente foram vários casos novos em destaque nas mídias. "O número de casos de violência é o que mais me chamou a atenção. Ao mesmo tempo, por se tratar de uma pesquisa, trago um recorte com o objetivo de alertar sobre esse problema social, assim como soluções para refletirmos e pensarmos numa questão preventiva.



Em uma imersão nos grupos reflexivos que acompanham homens envolvidos em casos de violência doméstica, Caldonazzo explica que o objetivo dos grupos é levar o agressor para um diálogo com uma equipe multidisciplinar, levá-lo a desconstruir os motivos que o levaram à agressão e responsabilizar o cidadão pelo ato cometido. "E importante desconstruir os aspectos da masculinidade que fazem mal para os outros", reforça. A autora explica que não existe um perfil de agressor. "Acontece com diferentes faixas etárias, classes sociais, idades e profissões. O objetivo dos grupos reflexivos não é penalizar, mas responsabilizar", salienta.

"Fazer a desconstrução dessa masculinidade hegemônica - que é o modelo ideal de ser homem que concebem - é difícil, mas os grupos ajudam os homens que cometem violência doméstica a terem mais controle emocional e eles próprios relatam que em momentos de ira, recordam-se do que ouviram nos grupos e conseguem se manter pacíficos. "Não é uma super mudança, mas ajuda a prevenir novas agressões, até porque por trás dessa violência e desse comportamento impositivo, há uma origem, uma raiz que precisa ser trabalhada", relata a autora.



VIOLÊNCIA, PREVENÇÃO E RAÍZES

De forma singular, "Violência contra a mulher: a desconstrução da masculinidade hegemônica", faz uma correlação entre Direito e estudos de gênero, além de trazer uma perspectiva interdisciplinar. Abordam-se masculinidades e grupos reflexivos para autores de violência doméstica contra a mulher, centrando-se em homens e mulheres cisgênero, dividindo-se em dois grandes aprofundamentos.



De um lado, aponta-se que os grupos reflexivos se desenvolvem, na prática, a partir de uma diversidade de temas, abordagens, metodologias e estruturas. De outro, na discussão sobre as múltiplas masculinidades, observa-se a dinâmica da masculinidade hegemônica se refletindo, normalmente de forma negativa – uma vez que é formada a partir de valores que tendem a reforçar uma lógica pautada na desigualdade de gênero, racismo e cisheteronormatividade –, na vivência dos homens brasileiros.



Diante disso, e pautando-se na premissa de que os grupos devem ter como objetivo imediato a desconstrução da hegemonia, é possível questionar: em que medida os grupos reflexivos brasileiros conseguem desconstruir a masculinidade hegemônica? Parte-se da hipótese de que as diferenças entre as propostas desses serviços brasileiros abrem, também, uma diversidade de limites e potencialidades para que aproximem seus participantes de mudanças. Conclui-se, de forma geral, que há desconstruções de alguns aspectos da hegemonia, mas a permanência de outros, e, a partir de uma pesquisa exploratória, bibliográfica e documental, sugerem-se parâmetros que parecem contribuir para uma maior efetividade dos grupos, bem como apontam-se lacunas para futuras pesquisas sobre o tema.



Sobre a autora

Servidora pública vinculada ao Ministério Público do Estado do Paraná, Tayana Roberta Muniz Caldonazzo, é formada em Direito pela Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP. Mestre em Ciência Jurídica pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Jurídica da Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP. Foi bolsista pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e participa dos grupos de pesquisa "Direitos: Estado e Bioética" e "Intervenção do Estado na Vida das Pessoas." Pesquisa sobre Direito e estudos de gênero, com ênfase em grupos reflexivos sobre violência doméstica contra a mulher e masculinidades.



Serviço:

Violência contra a mulher: a desconstrução da masculinidade hegemônica

Autora: Tayana Roberta Muniz Caldonazzo

Editora: Juruá Editora

Valor: obra impressa: R$79,90 / versão digital: 57,70