Dois escândalos envolvendo queixas de assédio sexual ocorreram, em um intervalo similar de tempo, no Brasil e Reino Unido. No Brasil, o ex-presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, foi acusado por funcionárias do banco de praticar o crime. No Reino Unido, o primeiro-ministro britânico Boris Johnson renuncia ao cargo, após as denúncias envolvendo o parlamentar conservador Chris Pincher. Pedro Guimarães e Chris Pincher eram, respectivamente, figuras estratégicas nos governos a que serviam.

Por que os casos de assédio ocorridos na alta cúpula dos governos Bolsonaro e Boris Johnson detém resultados tão distintos? Aqui o caso manteve-se dentro da esfera de responsabilidade pessoal, já no Reino Unido, o caso provocou a renúncia do principal homem do governo britânico.

Guimarães tinha presença frequente nas intervenções semanais de Bolsonaro nas mídias sociais, com associação direta de sua imagem ao do presidente. Por intermédio da Caixa Econômica são pagos os benefícios sociais e demais programas de auxílio, o que reforça a estratégia política do atual governo e a proximidade entre a instituição e o atual governante.

Em Londres, Chris Pincher, membro do partido conservador no parlamento britânico e ocupante da posição conhecida como “Chief Whip”, responsável por manter o alinhamento dos membros do partido na direção traçada pelo gabinete, foi acusado de assediar dois homens. Tal acusação desencadeou uma sequência de eventos que culminou na saída voluntária de inúmeros membros do gabinete e, por fim, na renúncia de Boris Johnson, que já sabia do passado do seu colaborador.

Ambos os casos geraram crise nos respectivos governos. O tamanho e os impactos dessa crise devem ser comparados. No caso britânico, Boris Johnson já tinha perdido a sua popularidade, mesmo antes do escândalo, insuficiente para renúncia. Mas o desembarque sequencial de colegas membros do gabinete, todos do próprio partido, que era a base de apoio parlamentar ao governo no modelo parlamentarista, tornou o fato institucionalmente irreversível.

Temos aí um ponto fundamental que distingue o modelo presidencialista do modelo parlamentar, que é a forma de composição do gabinete e da escolha do primeiro-ministro. O modelo funciona a partir da coalização partidária que detém maioria e escolhe o gabinete e o primeiro-ministro. Trata-se de um modelo indireto e dependente da relação de confiança dos parlamentares em relação ao primeiro-ministro. A coesão partidária e a unidade dos partidos vencedores são um fator fundamental para manutenção do primeiro-ministro, e gerenciamento das crises com mais flexibilidade do que de dos modelos presidencialistas.

No Brasil, os índices de aprovação do atual governante assemelham-se aos números de Boris Johnson. No entanto, popularidade por si só não provoca a queda de um chefe de estado, nem no caso britânico, nem no caso brasileiro, mas a capacidade de manter uma coalização sob seu controle é um fator muito importante para manutenção do status quo em ambos. Nesse caso, o modelo brasileiro revela uma relação entre o presidente e o Congresso Nacional, que permite uma separação mais direta entre ambas as casas. Ou seja, o que é responsabilidade do presidente não necessariamente é responsabilidade da coalização, que consegue se manter distante a ponto de isolar crises envolvendo a figura do líder do executivo.

O modelo britânico tem demonstrado a capacidade do sistema em se renovar no meio de uma legislatura, característica do parlamentarismo britânico. A fusão entre Legislativo e Executivo impõe um preço alto ao partido responsável por formar um gabinete, derivado de uma condução impopular do primeiro-ministro. O que não ocorre no modelo brasileiro, muito vinculado a ligação dos eleitores com o presidente, para além do conglomerado de partidos no congresso.

André Frota é professor de Relações Internacionais, Ciência Política e Geociências do Centro Universitário Internacional – Uninter.

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